sexta-feira, 15 de fevereiro de 2008

Estigma da doença mental

Ir para uma consulta com psicólogo, terapeuta, psiquiatra geralmente estigmatiza a pessoa no seio social. Ela fica " marcada " como desequilibrada, anormal, doente da cabeça, louca, deprimida, esquizofrênica, neurótica, lelé da cuca. Sempre se olha por baixo, uma pessoa com antecendentes psiquiátricos, como se faz nos antecendentes criminais. A ficha suja implica desde dificuldade de uma readaptação à diculdade num novo relacionamento. A pessoa doente da cabeça é doente até o fim da vida, o negócio é crônico, para alegria dos psicólogos, teraupeutas e afins.
Nada contra essas classes profissionais que ganham digna ou indignamente seu tutú fazendo a cabeça do povo que se vê sem cabeça. Tenho uma teoria que chamo de teoria da impotência. Nossa profissão revela nossa impotência. É expressão dela. Nossa vocação revela nossa potência. Não é por termos sucesso na profissão que temos vocação para ela. Basta observar a conduta além do sucesso. Há curadores da cabeça que são mais doentes que os doentes que tratam. Começaram suas carreiras justamente por reconhecer suas impotências. Há então muito estudo, muita conduta clínica que não passa de encenação, ninguém cura ou alivia ninguém. Vejamos a conduta de um psiquiatra: ele recebe e ouve o paciente, recorre aos seus estudos e orientadores para uma conduta clínica mais acertada, depois ou antes ou durante soca uma medicação no paciente. O paciente passa a tomar suas pílulas por anos e anos. Os laboratórios farmacêuticos recheiam esses profissionais de brindes. Afinal a conduta deles aumentou o número nas vendas de medicação. Tendo em vista a contemporaneidade este tratamento é multidisciplinar, beneficiando outros profissionais da área e supostamente o cliente. O paciente sofre com efeitos colaterais o qual combate com outras medicações que causarão outros efeitos e isso não tem fim até que ele se veja mais doente do que estava e o tratamento fica mais intenso ou não. O curador que tenta curar o outro tenta curar a si mesmo.
Onde se origina tudo isso? Os avanços da ciência conseguem minar as dores do ser humano? Há duas realidades: corpo e mente. Assim que nossa cultura se concebeu, em torno desses conceitos distintos e conflitantes entre si. Muitas práticas científicas se fundamentam ou só no corpo ou só na mente. A informação que temos com herança gregra, um presente de grego é que temos a mente e o corpo. Nossa cultura então foi construída assim, com coisas para o corpo e coisas para a mente. Profissões para o corpo e profissões para a mente, doenças para o corpo e doenças para a mente. Não há unidade e e essa ilusória diversidade de eus que teóricos doutores ao longo da história inventaram ou nomearam encheram nosso modo de viver.
Poucos apreciam o bem-estar de uma forma desprovida da dictomida: da mente, do corpo. Saúde mental e corporal, emocional (sensação-sentidos) e espiritual ( religiosa-transcendente), continuamos a dividir para conquistar. Conquistar o quê com a fragmentação da realidade? Esse é o viés da ciência: fragmentar para conhecer. Mas não há ciência quando não se sabe como utilizar o conhecimento.
Hoje e nos tempos que se seguirão parece que as áreas que lidam com os tormentos da alma, da psiquê, da mente são indispensáveis para uma sobrevida saudável num mundo caótico como sempre foi esse nosso mundo. As pessoas em nome da idéia de conforto e de eu imposta pela consciência dominante se enfraquecem e se rendem. Buscam no tratamento de uma doença mental a paz, a segurança , a força , o equilíbiro, o amor. Surgem novas especialidades focadas nas demandas : o que você quer eu posso te dar de um jeito ou de outro. É o serviço. A profissão.
Equilíbrio é uma ilusão. Tudo está em constante movimento, em desequilibração. Tentar equilíbrio é ir contra a natureza e por isso, adoecer. A constatação é o primeira dose do verdadeiro remédio, a aceitação a dose mais forte e a cura vem com a capacidade de transcender. O sofrimento é existencial. Basta estar aqui para sofrer, e tomar pílulas e ir à consultas com doutores da mente não aliviará em nada, será apenas um desvio de sua dor para os efeitos colaterais de uma nova abordagem de sua realidade: você é dependente. Assim como eu e todos nos cercamos como que institivamente por alguma proteção. A manada, o rebanho, estamos aí. Seguimos os padrões, as idéias, as tendências. Não criamos nem fomos criados. Somos cópias que se reproduzem. A função primordial dessas classes de terapias, com seus doutores e teóricos sejam psiquiatras, neurocientistas, psicólogos e terapeutas de toda a sorte é adequação. Por uma particularidade no ser ele se torna uma anomalia, alguém que precisa ser tratado para poder viver em sociedade. Nisso o tratamento das doenças mentais não visam a saúde do ser, mas sua reintegração ao convívio social, ainda que dopado e confuso. É mais que uma questão de saúde a não aceitação das diferenças. Talvez tenha havido nobres ideais de cura, de restabelecimento das plenas potencialidades humanas, mas olhando o quadro atual, as doenças da mente são carnes num açougue virtual. Não se quer a prevenção, quer-se o tratamento. O ser humano está carente de atenção. É uma carência que compromete sua saúde. Pois a doença é um refletor, uma luz incidente sobre as angústias do ser, sobre o próprio ser que só se vê existente se notato pelo o outro. A manada cumpre muitas funções à sobrevivência da espécie.
Existem sim as descompensações fisiológicas que geram estados de alteração de comportamento e de percepção. Tudo pode ser tratado. Mas a modernidade fez com que qualquer coisa se fixe em nós e gere doenças. Pior, qualquer alteração que gere uma crise nos faz correr para os consultórios. O ser humano perde a capacidade de lidar consigo mesmo e com o outro. Ele cria necessidades e não vê como sua a capacidade de ser feliz, de ser quem é. Ele não sabe quem é, não investe em se descobrir, e por isso compartilha com o mundo, quem ele não é. A raiz de toda doença é isso: não sermos quem somos. Sermos o corpo, sermos a mente, sermos o que os outros querem, para tristeza do próprio coração.
Mas vale a reflexão: pílula, droga para quê? Psiquiatra, psicólogo... quem precisa deles de fato? Se o que eu sou é como estou o que posso mudar? O que é a minha doença? O que é a minha saúde?
O estigma se refaz como preconceito. A própria pessoa luta, é resistente em se abrir ao outro, seja ele o terapeuta ou o namorado ou o amigo. Colocamos em xeque a aceitação que teremos. Nisso as relações superficiais não nos castigam. Não há tempo para o outro nos conhecer. Nisso qualquer terapia se invalida. Não há disposição em me mostrar se o terapeuta não se mostrar primeiro. Então se fica encenando: um finge que se trata, outro finge que trata. A doença não é apenas mental é monumental. A doença nos garante de alguma forma, mas está longe de ser vertida nalgum aprendizado para o doente. Vira e mexe ele recai, ou o mal volta com outra máscara.
Cada doença tem sua causa, tem seu sintoma, sua cura e é claro sua finalidade. Qual é a finalidade de sua doença, pergunte-se. Vá sem medo para as causas. A cura sempre está na causa e na finalidade, nunca no sintoma ou no tratamento ou no terapeuta. A cura está ali porquê ali está você mesmo.
Por fim hoje penso que não há doenças mentais ou psiquiátricas. Há o não ser, a anulação da busca, a aniquilação do tornar-se. Quando nos reconhecermos livres até para sofrermos, muitos males contepomporâneos desaparecerão. Quando percerbermos que podemos trocar a medicação por meditação, que nosso trabalho pode ser prazerosa brincadeira e nossas relações pautadas na sinceridade pela verdade de quem somos...aí a doença não será nem em lembrança do corpo ou da mente. Ela será combatida no começo e vencida assim. Nossas condutas serão mais preventivas do que corretivas. Saberemos que o que chamamos por muito tempo de mente sequer existiu. Que somos por inteiro uma humanidade histórica e social condensada em cada célula. Que o nosso corpo somos nós, que nossa mente somos nós e que nós somos. Não cuide de seu corpo, não cuide de sua mente... cuide-se por inteiro.